Outubro Rosa: a luta de uma cientista contra o câncer de mama mais agressivo

Há mais de três décadas, a pesquisadora Luciane Cavalli dedica sua carreira a desvendar os mistérios de um dos tipos mais desafiadores de câncer de mama: o triplo-negativo. Professora do Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia Aplicada à Saúde da Criança e do Adolescente, da Faculdades Pequeno Príncipe, e pesquisadora do Instituto de Pesquisa Pelé Pequeno Príncipe, Luciane é uma das referências na área no estudo desse subtipo da doença, conhecido pela limitação de alvos terapêuticos específicos e pela maior incidência entre mulheres de origem latina e africana.
“Esse tipo de câncer não apresenta receptores hormonais nem a proteína HER2 em excesso. Isso significa que, de forma geral, ele não responde às terapias hormonais, como o tamoxifeno, nem à imunoterapia mais comum, realizada com a herceptina”, explica a pesquisadora. “Por isso, os tratamentos disponíveis são geralmente a quimioterapia, a radioterapia e a cirurgia.”
O câncer triplo-negativo: um desafio da ciência
O câncer de mama é uma doença heterogênea — há vários subtipos, determinados por características moleculares que definem como o tumor se comporta e responde ao tratamento. No caso do triplo-negativo (HR- e HER2-), as células tumorais não apresentam níveis altos de receptores hormonais (para estrogênio e progesterona) nem a proteína HER2, o que impede o uso das terapias mais eficazes para outros tipos de câncer de mama.
Esse subtipo representa 10% a 20% dos casos de câncer de mama e costuma ser mais agressivo, com maior probabilidade de recorrência e prognóstico menos favorável. Estudos mostram que ele afeta com mais frequência mulheres negras e latinas — um dado que motivou Luciane a aprofundar sua linha de pesquisa.
“Percebemos que a incidência desse subtipo é mais alta em populações de origem africana e latina, o que ajuda a explicar as desigualdades nas taxas de mortalidade” por esse câncer nessas populações, comenta a pesquisadora. “Grande parte dos meus estudos foi realizada com pacientes brasileiras, americanas e africanas, justamente para compreender essas diferenças e buscar respostas que possam melhorar o tratamento para todas.”
Pesquisa internacional e novos caminhos
Entre as publicações mais importantes de Luciane Cavalli estão aquelas dedicadas ao estudo epigenético dos tumores, mais especificamente os microRNAs. Esses são pequenas moléculas que atuam dentro das células e podem influenciar diretamente o comportamento dos tumores. Em trabalhos publicados em revistas científicas de alto impacto internacional, a pesquisadora mostrou que estes grupos populacionais — de mulheres de origem negra e latina — apresentam perfis distintos de expressão de microRNAs. Essas diferenças estão relacionadas a fatores clínicos que aumentam o risco de evolução agressiva do tumor, como o risco de desenvolvimento de metástases.
Essas descobertas podem ajudar a entender por que o tumor triplo-negativo é mais agressivo nesses grupos populacionais — e abrir caminho para terapias novas e mais eficazes.
“Entender os mecanismos moleculares envolvidos no câncer é um passo importante para reduzir desigualdades raciais na oncologia”, destaca a pesquisadora.
Mesmo com os avanços científicos, a prevenção e o diagnóstico precoce continuam sendo as armas mais poderosas contra o câncer de mama.
O autoexame, o acompanhamento médico regular e a mamografia são medidas que salvam vidas — especialmente quando a doença é detectada em estágios iniciais.
“A ciência avança, mas o cuidado com o próprio corpo é insubstituível”, afirma Luciane. “Detectar o câncer cedo faz toda a diferença na chance de cura.”
A origem do Outubro Rosa
A campanha Outubro Rosa nasceu nos Estados Unidos, no início da década de 1990, com a distribuição do laço cor-de-rosa pela Fundação Susan G. Komen for the Cure durante uma corrida pela cura do câncer de mama.
A iniciativa se espalhou pelo mundo e chegou ao Brasil em 2002, quando o Obelisco do Ibirapuera, em São Paulo, foi iluminado com a cor símbolo da campanha. Desde então, outubro se tornou o mês de mobilização global pela conscientização sobre o câncer de mama — um convite para o cuidado, o diálogo e o acesso à informação.
“O Outubro Rosa é mais do que uma campanha, é um lembrete de que informação também é prevenção. Cada mulher que se cuida está ajudando a transformar as estatísticas” e a salvar sua vida, conclui a Luciane.